Estamos todos apreensivos; sinal de que nos preocupamos e que queremos que as crianças estejam bem. Vemos este regresso às aulas com tantas regras. Tantas rotinas estranhas, contrárias ao que normalmente desejaríamos para um ambiente de aprendizagem que promova a curiosidade, a espontaneidade, a partilha, o afeto.
Não temos dúvidas de que estamos todos a tentar dar o melhor que temos, que sabemos, para que tudo fique bem. Mas “ficar tudo bem” não pode significar apenas termos uma comunidade sem Covid-19. Temos a obrigação de, em comunidade, pensar no impacto para além da doença física que tudo isto está e poderá vir a ter… E agir! Algumas crianças tiveram a sorte de, apesar de terem estado privadas do contacto com os seus colegas da escola (salvo raras exceções), ter contactado com outras pessoas, com a rua, com a natureza. Mas para muitas crianças sabemos que não foi assim. Para muitas crianças – mostram-no os primeiros estudos – a realidade destes últimos 6 meses, foi a “pandemia” dos ecrãs, das paredes do apartamento, do horizonte do prédio da frente (e pouco mais).
Regresso às aulas terrivelmente exigente
Para quase todas as crianças deste país, os próximos meses vão ser incrivelmente desafiantes, especialmente a partir do primeiro ciclo, com perdas nunca vistas de liberdade e espontaneidade de se ser criança.
“Elas vão adaptar-se” – ouvimos repetidamente. Todos sabemos que sim. Assim como se adaptam a qualquer adversidade das suas vidas. As crianças “adaptam-se”… sobrevivem – está na nossa natureza humana – mas ficam marcas (e os estudos mostram que a ansiedade e a depressão são apenas os primeiros sinais visíveis). “A infância não se repete, fica para sempre”, como se leu há dias num comentário nas redes sociais e nós, adultos, temos um papel fundamental no que vai ficar.
É fundamental que possamos, com responsabilidade, pensar em alternativas. E agir.
É imperativo, neste regresso ás aulas, exigirmos da escola respeito também pelas necessidades das crianças, para além do Corpo Físico. Uma criança ansiosa, distante, passiva terá muito mais dificuldades em aprender e crescer feliz – não há dúvidas. Agora, mais do que nunca é vital salvaguardar o tempo ao ar livre (onde, aliás, o risco de contágio é consideravelmente menor) para pelo menos brincar mais… e até estudar, sempre que for possível. O combate ao vírus não se pode fazer com constante evitamento, mas sim com verdadeiras medidas de prevenção, que as crianças, aliás, entendem muito bem: o sintoma zero (se há sintomas há que ficar em casa), a higienização das mãos, a etiqueta respiratória e o distanciamento físico de pessoas que não façam parte dos círculos habituais de convívio.
Alternativas nas dinâmicas familiares
Com ou sem mudanças nas escolas é também imperativo que nós, pais, agora mais do que nunca, façamos parte das alternativas. Que encontremos nas nossas dinâmicas familiares espaços e tempos para que as crianças brinquem, se encontrem com os seus amigos, num ambiente descontraído e natural, para além do mundo confuso que são grande parte das escolas e das atividades organizadas deste país, por esta altura. Fomentar uma vida com mais tempo ao livre, na rua, em atividades na natureza não é um luxo – é uma necessidade:
para que haja tempo para celebrar a vida e ser criança, longe dos ecrãs e das paredes de casa;
para que se mantenha viva a ideia de que o normal é o encontro, a descoberta, a equipa, a celebração;
no fundo, para que se crie nas crianças uma esperança verdadeira de que vai realmente ficar Tudo bem, para além dos desenhos de arco-íris.
A responsabilidade é de todos e só juntos podemos fazer face às pandemias que nos assolam (a do vírus e a do medo). No Brincar de Rua somos parte da solução. Por isso vimos reforçada a nossa missão de ajudar gratuitamente as comunidades a construir um futuro mais saudável e feliz para todos, proporcionando aos miúdos mais tempo de brincadeira livre, ao ar livre, com as pessoas que fazem parte da sua comunidade: verdadeiras Tribos, de confiança, de alegria e de esperança. As Tribos do Brincar são uma pequena lufada de ar fresco, a oportunidade de uma nova rotina de bem-estar na vida da comunidade e das crianças em particular.
Seja qual for o caminho, desejamos a todas as crianças e às suas famílias um regresso às aulas tranquilo e um ano letivo feliz e enriquecedor… com segurança, mas sobretudo com bom senso!
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